domingo, 22 de abril de 2018

Homenagem a Nelson Pereira dos Santos (1928 - 2018)

Foto reproduzida do site a BandNews e postada pelo blog, 
para ilustrar o presente artigo

Texto publicado originalmente no Facebook/Clara Angélica Porto*, em 21/04/2018

Abro o telefone para ver se tem mensagem. Nada. Mas Facebook tem. Vou lá. Dou logo de cara com Nirton Venancio anunciando a morte de Nelson Pereira dos Santos. Fiquei muda, gritei de susto, tudo junto. Lembrei de Nelson, a quem conheci aqui em Nova York, numa exibição de Vidas Secas, no BAM. Depois do filme, Nelson foi chamado para perguntas e respostas, mas ficou complicado, pois o inglês dele não era fluente. Pediram ajuda, levantei-me e fui. Quando acabou, ele me convidou para um jantar que a diretoria do BAM estava lhe oferecendo. Fui e tive a honra de sentar ao lado dele. Não hesitei e pedi logo uma entrevista, uma das melhores entrevistas que tive o grande prazer de publicar no jornal The Brasilians. Fiquei encantada com Nelson, e quem não ficaria? Não era só pela inteligência, pela arte, pelo cavalheirismo, pelo cuidado de segurar o guarda chuva na fina chuva de Nova York para que eu não me molhasse - era por tudo o que era Nelson Pereira dos Santos. No ano seguinte, um telefonema inesperado. Nelson me ligava do Rio, contando que viria participar do Tribeca Film Festival com Brasília 18% como competidor, e Iria também mostrar Vidas Secas. Vibrei, mas o melhor estava por vir: “quero que você seja minha intérprete/acompanhante e contato com a imprensa. E tenho verba!” “Ah, Nelson, para você eu faço de graça, Deus me livre, qualquer coisa por você.” “Eu sei, Clara Angelica, mas eu insisto, tenho verba para isso e tem que ser você”. E foi. Ele veio com a esposa Ivelise e a filha. Levei varios jornalistas de diferentes jornais para entrevistar Nelson no hotel. Fui intérprete em todas as perguntas e respostas de todas as exibições. Participei ao lado dele de todos os almoços, jantares, festas e recepções. Ao lado dele e de todos os atores e diretores do festival, inclusive Robert De Niro, que o tratou com especial reverência. Ver Vidas Secas ao lado de Nelson foi emoção para alimento de alma por muito tempo. Ajudei-o a retirar do recinto no meio do filme, uma senhora que ficou tão tocada com Vidas Secas, que teve um ataque incontrolável de choro. Voltamos trêmulos para ver o resto do filme. Levei ele e Ivelise a Chinatown, saímos chutando lata por Nova York, livres e felizes. Quando fui ao Rio, ele me disse que ia fazer a sopa dele de peixe, o único prato que fazia bem. Fui ao apartamento deles, tomamos vinho tinto, namoramos o Cristo Redentor da varanda, vi o sótão onde o artista trabalhava. A velha máquina de montagem lá estava, já aposentada pela tecnologia digital, mas ainda o brinquedo preferido de Nelson - “sou um montador”. Momentos inesquecíveis, momentos lindos. Um homem simples, um homem complexo, um homem único e plural. Nelson Pereira dos Santos e Glauber Rocha são a essência do Cinema Novo brasileiro. Sinto uma tristeza enorme. A vida fica mais seca sem Nelson Pereira dos Santos. Deixa um legado imenso na história do cinema brasileiro, este homem que levou páginas belas da literatura para as telas. Tudo que Nelson tocou, virou ouro. Tenho uma coleção sem preço de filmes de Nelson e acho que Memórias do Cárcere é uma obra prima. Nelson foi diretor/montador de obras primas. Nelson Pereira dos Santos foi uma obra prima. Estará sempre vivo no meu coração.

* Depoimento de Clara Angelica Porto, em post no seu perfil do Facebook, no dia 21/04/2018

Texto reproduzido do Facebook/Clara Angelica Porto

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